Termino o ano com inconclusões: algumas costuras clínicas
- Alana Loiola
- 16 de dez. de 2024
- 2 min de leitura
Bom, ainda bem, quando concluímos, não sobra espaço para algo mais, para criação, para outras ideias, relações, afetos... Quando concluímos, esgotamos.
Termino 2024 com mais um ano na clínica, mas sinto-me diferente de quando comecei e repito, ainda bem.
Esse ano mudei de sócios, pela 1º vez em anos, o que foi importante, mudei o ambiente, cuidei de outros detalhes que não estava prestando tanta atenção.
A clínica exige de nós muito trabalho interno e externo, interno de fazer manutenção da vitalidade, prestar atenção em nosso narcisismo, prestar atenção que o que precisamos não é igual ao que o outro precisa, isso vale para relação terapêutica, o que eu preciso não necessariamente será igual ao que o paciente precisa (nosso desejo não é senhor de nossos pacientes) aí que está a beleza da alteridade, reconhecer as diferenças, se relacionar com elas e colocar atenção e ética em seu devido lugar.
Termino esse ano com outras inconclusões sobre esse trabalho clínico, além do divã, além das quatro paredes, além daquela relação clássica, clínica se faz em laço, pares, questões, mais questões, muitas perguntas, ou seja, o poder construtivo das supervisões, intervisões, discussões de casos clínicos, escrita cientifica, estudos e muitas discussão desse combo todo. Que a rigidez técnica e manejo só serve ao analista e talvez às suas vaidades.
Clínica não está pronta e não fica. Ou seja, ela não se conclui. Se eu sucumbir a isso me esgotarei.
Estar inconcluída na clínica me dá mais possibilidade de construí-la, discuti-la, elaborá-la, reconstruí-la e assim (re)formando o dispositivo de escuta analítica cada vez mais.
Termino esse ano com as ideias de que a clínica pode ser mais sensível, sem perder seu enquadre, sentir o paciente dentro (vide Einfuhlung, noção de S. Ferenczi), observar e admitir as constratransferências, mas sem invadir o paciente com aspectos egóicos, compreender as falhas, as ausências de técnica tem sua razão de ser, como precisam ser admitidas (bendita seja a supervisão), o cuidado do paciente pode acontecer, no entanto, jamais podemos perder de vista nossa função analítica. Os “contrastes” clínicos são reais, logo, esse ano termino dando esse nome para alguns fenômenos.
Termino sem terminar, termino CONTINUANDO, costurando a clínica não somente da técnica (isso entedia e cria distâncias em qualquer relação, eu penso), costurando com outras linhas, nessa interlocução entre o que sinto em minha análise, no que sinto com a poesia, nas minhas escritas, nas escutas clínica feitas fora do muro do consultório (nos projetos sociais), nas infâncias que me atravessaram, nas dores fora do meu corpo, nas questões sociais compartilhadas, nas supervisões e discussões de textos. Clínica se faz em coletivo e na insistência.
Termino esse texto com Carolina, pois construir uma clínica também nos exige coragem e audácia: “Falavam que eu tenho sorte, eu disse-lhes que eu tenho audácia”. (Carolina Maria de Jesus).
Alana Loiola